quinta-feira, março 28, 2024
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Do caos a nós

por: Redação

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Desprezar a imaginação das crianças é fechar-se na miserável vida de adulto que, sem fórmulas, perde o rumo, diz André do Valle em sua coluna

André do Valle, cidadão barueriense, é ator e roteirista. Como teatro-educador, consegue comunicar-se ao mesmo tempo com crianças, adolescentes e adultos – o que lhe dá a capacidade de tratar com leveza e bom humor os assuntos mais difíceis, complexos e polêmicos.
André do Valle, cidadão barueriense, é ator e roteirista. Como teatro-educador, consegue comunicar-se ao mesmo tempo com crianças, adolescentes e adultos – o que lhe dá a capacidade de tratar com leveza e bom humor os assuntos mais difíceis, complexos e polêmicos.

Você já notou como as pessoas andam viciadas em redes sociais, internet e essas coisas? Já viu ou esteve junto em situações onde um monte de gente dividia a mesa de algum lugar, a comida, os líquidos e… bom, e nada mais que isso? “Cada um no seu quadrado” e ninguém interagindo com quem estava fisicamente lá?

O primeiro deus da mitologia grega foi Caos. Sua imagem mais próxima é um abismo úmido e escuro, cuja queda é infinita. Dele nasceu Gaia – a Deusa Terra. Gaia é o chão, a estabilidade, o “certo”, o “seguro”, a “rotina”…

Bom lembrar que os gregos não sabiam que estamos numa bolinha muito pequena que dança no espaço sem fim. Sua religião, portanto, hoje estudada por nós como mitologia, tentava explicar a vida de acordo com o que se sabia dela. Repara, por exemplo, nas teorias que as crianças constroem sobre o mundo e as coisas. A ingenuidade delas é risível à maioria dos adultos.

Adultos conhecem vários mistérios. Adultos contemporâneos, então… Nossa! Que diriam os povos antigos se, como nós, já soubessem que habitamos um lugar menor do que a menor estrela vista no céu?! Se conhecessem a teoria do Big-Bang?! Se sacassem que cada um dos seus deuses não passava de um delírio inspirado pela ignorância em relação ao real?!

Hoje, pra quem estuda um pouco mais, os deuses estão mortos; não há ordem alguma no Universo e sim uma sorte fantástica; ninguém olha por nós; estamos sozinhas e sozinhos, buscando alguma segurança pelos meios em que mais ou menos cremos e pouquíssimos somos os que enfrentamos tudo isso de cabeça erguida e sem procurar miragens no gigantesco deserto da existência!

No entanto, imaginar anda meio fora de costume. Os brinquedos, cada qual com suas funções, parecem escolher pela criança como será a brincadeira dela e não o contrário. Algumas empresas, senão a maioria, falam em “risco zero”. (Imbecis!). A incompetência pra lidar com dúvidas e angústias torna muita gente refém de charlatões que prometem certezas imediatas e receitas pra se viver bem. Vide a variedade dos livros de auto-ajuda, todos muito vendidos, bastante catárticos e que, no fundo (se é que há fundo neles) dizem a mesma patacoada. Olha o percentual da população favorável à redução da maioridade. Vê o tanto de… de… de gente que votaria no Bolsonaro.

An4E quer mais?! … Pede pra um homem conservador comentar o feminismo; procura saber o que a palavra “homofobia” vem causando nas famílias; dá uma pesquisada em como as escolas estão lidando com os celulares. Opa! Os celulares!

Quando você ri das teorias duma criança, sem prestar-lhes atenção, tu acabas cometendo o mesmo erro dos que estudam um pouco mais. Porque mesmo que represente a estabilidade e a segurança, Gaia é filha de Caos e, assim, carrega seu gene. E nós, crias da Terra, também o guardamos no espírito.

Tem gente viciada em games, em doces, cigarro, drogas, remédios, bebidas… Mas, em celular?! Não, nisso não. O que há do outro lado das redes sociais? Bingo!!!, são pessoas! Assim, é bom você saber que quando alguém te troca por uma conversa virtual, significa que o instante ao seu lado não está tão bom quanto o papo com quem tá longe. O que há no nosso tempo é simplesmente um novo jeito de se relacionar. Uma forma libertadora, que nos reduz a influência dos lugares onde o corpo habita num determinado instante, tornando o dia-a-dia mais recheado de ação e menos de espera. E se você não lida bem com isso, sabe o que é?

É Caos! Fruto da imaginação viva dos nossos ancestrais! Deles, que por pensarem menos em questões técnicas e mais na vida, foram capazes de conceber uma metáfora que até hoje resiste em cada filha e filho de Gaia! Porque Caos é o abismo que ocupa todos os espaços de tudo que é novo! Até que esse novo seja explorado em todas as suas possibilidades e, do nosso conhecimento em relação a ele, nasça uma nova ordem! Caos é a imaginação das crianças, que, antes de serem deseducadas pela escola e muitas vezes pela família, possuem uma imaginação inenarrável!!! “Quando você  desenrola um durex, o que fica na mesa é o rastro, o passado. O futuro é o tanto de durex que ainda tem pra desenrolar. E a vida não é nem o passado nem o futuro. Vida é o barulhinho que faz enquanto o durex se desenrola.” Frase de um aluno meu de nove anos.

Continue menosprezando a imaginação das crianças e seja cada vez mais miserável em sua vidinha fechada de adulto, que sem fórmulas perde o rumo! E se você é desse tipo que estudou um pouco mais, é só estudar mais ainda, pra ver que nenhum, absolutamente nenhum dos deuses de nenhuma das culturas morreu! Porque Eros – o desejo – ainda pulsa vibrante em nós! Ágape – a força da caridade – nos é despertada sempre que nos reduzimos um pouco para que alguém possa expandir!

Caos, portanto, é aquilo que ainda não conhecemos, mas onde já nos submergimos. Caos é o que espera de nós uma conclusão; como o começo deixado por alguém, como um texto inacabado… Caos é, nesse instante, o fim da distância entre pessoas que não podem estar ao mesmo tempo no mesmo lugar.

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